Aquele gosto amargo ainda não desceu pela garganta, nem a
dúvida do consciente, diante de sua ausência mais devastadora.
Mais que sua ausência, sinto saudade dos risos que não
demos, das mãos dadas em dia de sol no parque, o ombro jeitoso recebendo minha
cabeça cheia de problemas e aliviando um a um.
Foi-se embora sem dizer adeus, seus olhos que brilhavam em
minha direção, os beijos latejantes e suculentos, de bocas que se encaixam e se
desejam.
Deixou-me de coração vazio de todo o amor que se poderia
dar, deixou o eco dos sonhos que poderiam se realizar, levou uma vida desenhada
em rascunho.
Ficou no lugar o medo do coração covarde, aquele que se
esconderá, aquele que anda em sombras, gelado e descrente.
Num dia de lua fria, em meio aos calafrios, insistentes perguntas
sem respostas, sentindo cada peça quebrada, insegurança e culpa de ser quem se
é, só me resta aconchegar-me em mim mesma, fechar os olhos e ir.
De repente chorar ficou tão fácil, “ tristeza, por favor, vá
embora”, já clamava o sambista.
O que pode salvar um coração petrificado?
O calor de uma amizade, a força de uma prece, a lembrança
secreta de que amanhã, ah o amanhã, será mais do que hoje, mais feliz, ideias
em ordem, e vida na devida ordem.
Parlapatéia inspirada em alguem que foi embora...será?